quarta-feira, 19 de outubro de 2011

A PRODUÇÃO ESCRITA NA ALFABETIZAÇÃO



No decorrer da história a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural do sujeito. Ensina-se os sujeitos a desenhar letras e construir palavras com elas, mas não se ensina a linguagem escrita, dessa forma segundo Vygotsky (1991, p.119) o ensino da linguagem escrita depende de um treinamento artificial, a escrita lhes é imposta de fora, vindo do professor, ao invés de se fundamentar nas necessidades naturalmente desenvolvidas dos sujeitos e na sua própria atividade.
Para compreender a escrita o ponto de partida é concebê-la como um processo de apropriação de um objeto socialmente constituído em que existem uma série de modos de representação que precedem a representação alfabética da linguagem.       
Historicamente existem três métodos de alfabetização, conforme os estudos feitos por Ferreiro (1995, p.29), que subsidiam a aquisição da linguagem escrita: o sintético, o analítico e o analítico-sintético. Uma breve explicação suscitará a concepção de cada método mencionado acima.  O método sintético caracteriza-se por unidades menores como letras, som, sílabas, e caminha em direção as unidades maiores e significativas da palavra, frase e textos. O método analítico tem como premissa fazer com que o alfabetizando relacione o concreto à significação, assim o ponto de partida é sempre o todo, que pode ser um conto, uma sentença ou palavra. O método analítico-sintético, engloba os dois métodos anteriores, combinando os dois processos envolvidos: análise e síntese.
No entanto, o método na aquisição da linguagem não é tudo, são apenas um conjunto de momentos e técnicas organizadas de acordo com uma determinada lógica realizados e aplicados em determinados momentos visando a aprendizagem dos sujeitos em relação a escrita e leitura. Se for ponderado somente o método como forma a desenvolver a prática pedagógica na aquisição da escrita, fica explícito o processo como ensinagem, ou seja, o professor é o ensinante e o sujeito um mero aprendente.
Emília Ferreiro(1991)  propõe uma abordagem de deslocamento do eixo, do como se ensina, para como a criança constrói seu conhecimento a cerca da linguagem. “Nossa atual visão do processo é radicalmente diferente, no lugar de uma criança que espera passivamente o reforço externo de uma resposta produzida pouco menos que ao acaso, aparece uma criança que procura ativamente compreender a natureza da linguagem que se fala a sua volta, e que, tratando de compreendê-la, formula hipóteses, busca regularidades, coloca à prova suas próprias antecipações e cria sua própria gramática. No lugar de uma criança que recebe pouco uma linguagem inteiramente fabricada por outros, aparece uma criança que reconstrói por si mesma a linguagem, tomando seletivamente as informações que lhe provêm do meio.” (op.cit., p22) Ferreiro busca descrever o que é comum nas trajetórias individuais dos sujeitos, durante o processo de aquisição da base alfabética da escrita.
Através da escola não é a única maneira de conhecer e desenvolver a linguagem escrita, pois o sujeito inicia sua alfabetização desde muito cedo no contato com o mundo letrado, não esperando entrar na escola para se questionar e compreender a representação da linguagem seja escrita ou oral dada as situações sociais vividas. Esta concepção vem ao encontro aos princípios teóricos de Paulo Freire em relação a alfabetização, ou seja, os conhecimentos de mundo dos sujeitos os conscientizarão  da sua condição e sua prática na construção de novos conhecimentos e ao desenvolvimento de novas estruturas de pensamento e linguagem.
As experiências vividas pelos sujeitos e as inter-relações pessoais são fundamentais ao processo de aquisição da linguagem. Na medida que, o sujeito desenvolve a linguagem facilita a interação comunicativa, compreendendo melhor a linguagem como um sistema de representações convencionadas.
Neste processo de aquisição da escrita o texto aparece como um estímulo que proporciona aos sujeitos um melhor desempenho lingüístico, de forma a participar e refletir sobre a linguagem escrita. Escrevendo textos o sujeito ressalta sua visão do mundo, produz sentidos e comunica aos outros o que pensa e sente.
A prática de produção de texto a partir da diversidade de gêneros é uma maneira de considerar a existência de diferentes formas de manifestação da linguagem. Para Bakhtin (1929, p.131) “a palavra é enunciação, e como esta é de natureza social, sua significação é inseparável da situação concreta em que realiza”.
No entanto a produção escrita precisa de uma certa organização para ser produzida: o planejamento, a estruturação ou linearização, a execução e a monitoria, que podem acontecer simultaneamente, quem vai dar essa organização é o escritor, na sua singularidade pressupõe decisões sobre o que e como escrever, por onde começar, em que direção seguir, que pontos ressaltar e como terminar o texto. Isso faz da escrita uma produção de sentidos, expondo particularidades, indícios sobre a relação sujeito/linguagem.
Através do processo de escrita  de textos o sujeito transforma-se, produz e reproduz a partir da sua experiência, constrói e reconstrói seu conhecimento em relação a linguagem e compromete-se com que escreve numa relação interacionista dialógica.
A presença de textos quer como objeto de leitura ou como produção no trabalho com linguagem na escola tem se caracterizado cada vez mais. Porém, para que a presença do texto na escola seja legitimada, ela não deve ser autoritária. Eleger textos para a aula, em leitura obrigatória feitas por indicações do professor até podem oportunizar um diálogo de sentido enfático de fala conjunta, no entanto como Geraldi (1997, p. 170) lembra “produz-se um discurso de sala de aula que, como a pergunta didática, faz do texto um meio de estimular operações mentais e não um meio de, operando mentalmente, produzir conhecimentos”.
Neste enfoque, buscar a legitimidade no uso dos textos na escola, é necessário, percebendo a leitura integrada ao processo de produção de textos. Através da leitura na interação leitor/texto faz-se uma construção de sentidos dos textos. Pois, o leitor pode ir ao texto em busca de uma resposta à uma pergunta  que tem, assim como, pode ir ao texto para retirar dele tudo que lhe possa oferecer,  outrora pode ir ao texto  nem para escutá-lo, nem para perguntar-lhe, mas para usá-lo na produção de outros textos, e ainda o leitor pode ir ao texto sem perguntas prévias, sem querer recolher a sua vontade de escuta e até mesmo sem pretendê-lo usá-lo, no entanto se construir na interação com o texto numa relação dialética.
Citelli (2001, p.173) enfatiza a necessidade de que o processo de construção de textos na sala de aula deve estar em passos muito bem definidos pelo professor, para que a prática de produção textual, não seja apenas uma sugestão aleatória, descontextualizada para o sujeito. Ela apresenta uma perspectiva em que a produção de texto deve estar ligada a uma seqüência planejada de atividades, com objetivos definidos que demandam escritas e reescritas, idas e vindas, leituras e outras leituras, além de uma avaliação do que foi produzido. 
O real sentido em trabalhar com textos na escola, seja em produções ou leitura, está em refletir as relações  sociais dos sujeitos escritor/leitor, suas experiências e motivações individuais que foram dialogicamente construídas. Rojo (2001, p.65) fundamentada na teoria bakhtiniana e nos PCNs  faz uma reflexão sobre a importância do professor  ser aquele que além de ensinar conteúdos, é alguém que transmite o valor que a  língua tem, demonstrando o valor que a língua tem para si. Dessa maneira se o professor tem uma relação prazerosa com a leitura e a escrita, certamente poderá funcionar como um mediador para seus alunos.
Conforme forem os estímulos e experiências na aprendizagem e desenvolvimento da linguagem na escola o aluno se sentirá mais ou menos envolvido nos eventos particulares da sua micro-história  individual.  Segundo Abaurre (1997, p.22) “a aquisição de escrita é um momento particular de um processo mais geral da linguagem”. Assim, a escola  precisa oportunizar um contato maior com textos, pois estes podem revelar particularidades  sobre a relação sujeito/linguagem  do aluno.

(Autora: Jaqueline Medeiros)


Referências Bibliográficas:

ABAURRE, M. B. M. Cenas de aquisição da escrita: o sujeito e o trabalho com texto. Campinas (SP): Mercado das Letras, 1997.

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1986





CITELLI, B. Produção e Leitura de textos no Ensino Fundamental: poema, narrativa, argumentação. São Paulo: Cortez 2000



FERREIRO. E. Reflexões sobre alfabetização. (Tradução Horácio Gonzales (et.al) 24.ed. São Paulo Cortez, 1995


FISCHER. A. Um processo de produção de sentidos: o texto dissertativo em uma 4ª série do Ensino Fundamental. Tese de Mestrado, Florianópolis (SC), 2001

PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: 1ª a 4ª série – Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, v.2, 1997. 144p.


VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991



_____.  Pensamento e Linguagem. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 1989

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